No segundo dia de WOW na Maré, Sueli Carneiro convoca Eliana Sousa Silva para luta global
Em uma das mesas mais esperadas desta edição do Festival Mulheres do Mundo WOW na Maré, o painel Confabular futuros a favor da democracia, neste sábado (25 de outubro), a professora e grande referência do movimento negro no Brasil Sueli Carneiro foi ovacionada ao convocar Eliana Sousa Silva a capitanear uma luta a nível global pela consolidação de democracia. Para alegria da plateia, a intelectual prometeu que, caso a diretora-geral do encontro no Brasil e fundadora da Redes da Maré aceite, terá todo o apoio dela, recebendo muitos aplausos das mulheres presentes, que encheram a Areninha Cultural Herbert Vianna.
Em sua fala, Sueli lembrou o quanto mulheres das últimas quatro gerações já lutaram e conquistaram direitos, e afirmou que "para nós, [mulheres negras, especialmente], luta é verbo".

Fazendo coro à provocação de Sueli à Eliana, Christiane Taubira, ex-ministra da Justiça da França, que participou pela segunda vez no WOW Rio, disse:
"Nós temos ambição de transformar o mundo. Para mudá-lo, nós não vamos apenas protestar ou nos sindicalizar; nós queremos mudar a relação de forças. Nós somos majoritárias em relação à nação humana. Nós educamos os homens. Se eles não quiserem vir conosco, nós somos majoritárias. Não queremos mais esse mundo racista, queremos o reconhecimento das nações indígenas, somos solidários aos povos ribeirinhos. A sororidade é uma fonte de energia incomparável".
Mediadora da mesa - que também é parte programação da Temporada França-Brasil 2025 -, a jornalista Flávia Oliveira abriu o encontro lembrando que, neste dia, há cinquenta anos, o jornalista Valdimir Herzog foi torturado, assassinado sob custódia do Estado, nos porões do DOI-Codi, órgão de repressão do governo brasileiro durante a ditadura militar. Ao seu lado, a professora, matemática e atual secretária municipal de Ciência, Tecnologia e Inovação, Tatiana Roque compartilhou com o público a experiência de lutar, ao lado da mãe, contra a ditadura militar. Filha de um desaparecido político, seus pais foram perseguidos e torturados. Diante da constatação do atual fortalecimento da extrema direita em todo o mundo, Tatiana propõe uma reflexão sobre a necessidade de aprofundar o diálogo com a nova classe dos trabalhadores, com o olhar atento a duas questões: a crise climática e as novas tecnologias. "Para construir democracia, só com mais democracia”, afirmou.
Lá fora, pelas ruas da Maré, já tradicionalmente mais agitadas aos sábados, dia da feira livre da Teixeira Ribeiro, a movimentação foi ainda maior. O público circulava pelos diversos espaços do WOW, em busca das múltiplas atividades que aconteciam simultaneamente. Feito por mulheres e para mulheres, o WOW entrou no ritmo da Maré, sempre em movimento e cheia de energia.
Além das rodas de conversa, de trocas de experiência, performances artísticas, oficinas, o dia foi marcado pela primeira edição do FutWOW, na Vila Olímpica Seu Amaro. Quatro times — MariEllas, Trans United, Elas por Elas e Futebol de Quinta - que se encontraram num torneio de futsal, para celebrar o esporte como ferramenta de transformação social e valorizar os talentos. Ao final de disputas muito acirradas, MariEllas terminou em primeiro, seguida por Trans Unites, em segundo lugar.

“Vim torcer pela minha companheira neste evento maneiro, que pensa na visibilidade e mostra que podemos estar em todos os lugares, pois temos potência”, afirma Thaline Cristine, torcedora do Elas por Elas. A jogadora Jacy Azevedo estava feliz com o torneio. “Estamos superando barreiras que precisam ser quebradas. Aqui é um local de incluir todas as diversidades”, conclui. Ao final do torneio, houve distribuição de medalhas e troféus.
Na mesma vibração, a roda de conversa Elas no esporte mostrou como atletas vêm rompendo barreiras e se tornando referências para outras meninas que sonham em seguir carreiras esportivas. Participaram do encontro a jornalista Carol Barcellos, fundadora da ONG Destemidas; a boxeadora e treinadora Miriam Parga; e a professora de educação física Raissa de Lima, com mediação de Antonia Pelegrino.
Raissa e Miriam são fundadoras do projeto social Pra Elas, criado em 2018, que visa incentivar a prática esportiva como ferramenta de autoestima. Raissa destacou que, antigamente, as oportunidades para mulheres no esporte eram escassas e restritas a poucas modalidades. Ela lembrou que, para conquistar espaço, é preciso enfrentar ambientes ainda predominantemente masculinos: “A gente precisa adotar estratégias o tempo todo, ter métodos para educar e se adaptar”, afirmou.
Miriam contou que, por meio do esporte, se sente realizada e enxerga novas perspectivas. Hoje, como técnica da seleção carioca de boxe, ela se diz realizada ao ver outras mulheres conquistando espaço e subindo aos pódios. “Eu compartilho com elas aquele sentimento, a emoção, o nervosismo e a alegria, e cada conquista que alcanço me motiva a querer mais”, afirmou.
Para Carol Barcellos, as diferentes formas de violência representam barreiras que afastam as mulheres do esporte. A jornalista defende que projetos sociais são portas de entrada fundamentais para que elas rompam os obstáculos e se aproximem dessa realidade.
Jornalista e apresentadora com mais de 20 anos de experiência em cobertura esportiva, Carol fundou, em 2017, a organização não governamental Destemidas, na Maré, com o objetivo de acolher e incentivar mulheres através da corrida. A ONG já impactou mais de 120 mulheres, promovendo autonomia e empoderamento feminino.
A partir das experiências das atletas, Carol Barcellos contou como elas inspiram outras meninas, abrindo caminhos e novas possibilidades para que possam construir seus próprios futuros. “A gente lida com meninas que já viveram diversos tipos de violência, e quando elas encontram no esporte um espaço de acolhimento e superação, passam a enxergar novas possibilidades para suas vidas”, completou.
Mais mesas na Areninha
Ainda na Areninha, as participantes da mesa Decidir é viver — justiça reprodutiva e violência de gênero como desafios coletivos, Ana Barreto, Emanuelle Góes, Rita Segato, com mediação de Milena Afonso, debateram o contexto desigual e injusto em que ocorre o debate sobre o aborto sobre o regime político que criminaliza e mata a mulher que aborta, sobretudo a mulher negra, inclusive no sistema de saúde público.
A antropóloga e professora Rita Segato iniciou sua fala com um questionamento que permeia toda a conversa: "O patriarcado não é como eles querem que a gente acredite, é um regime político. A grande pergunta é 'qual o problema para o capital que uma mulher faça um aborto?' Não é fácil responder: a defesa da soberania desafia todo o regime patriarcal do mundo".
Doutora em saúde pública, Emmanuelle Góes, formada no movimento negro da Bahia, lembra que desde 1994, mulheres negras, latinas, asiáticas já falavam sobre questões de justiça reprodutiva, o que no Brasil, só começou em 2014 como agenda política na epidemia do zica virus. "Justiça reprodutiva é falar em ter filhos com segurança e vê-los crescer, fazer escolhas na vida; fazer aborto de forma segura, não ser julgada e não morrer".

Atualmente residente nos Estados Unidos, a fundadora da ONG Libere, que está presente em oito países e tem foco na dignidade reprodutiva, Ana Barreto, nascida e criada do Jardim Ângela, em São Paulo, resumiu a questão que está no centro de sua pesquisa e que envolve direitos dos povos preto e indígena. "A gente luta por dignidade, a gente luta pelo básico. Como viver em um mundo em que a maioria de nós vive sem dignidade e morre sem dignidade?", indaga.
A advogada Milena Afonso, mediadora da mesa, resumiu: "Não há justiça reprodutiva sem justiça racial, justiça social".
Já na mesa Sementes que rompem o asfalto – jornadas de regeneração frente ao racismo ambiental, as participantes refletiram...
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